Por Jairo Luis Brod
Na Língua, como na Economia, a reserva de mercado costuma empobrecer falantes e países. Na década de 1980 e no início da seguinte, a xenofobia à tecnologia estrangeira redundou em uma reserva míope de mercado, responsável pelo colossal fosso tecnológico que repercute até os dias atuais. No terreno linguístico, também houve iniciativas de aversão ao estrangeiro. O ex-deputado federal Aldo Rebello conseguiu aprovar na Câmara dos Deputados projeto de lei que veda o uso de estrangeirismos. A proposição, que foi alterada no Senado Federal, aguarda nova apreciação da Câmara. Muitos estados e municípios chegaram a aprovar leis nesse sentido. Nenhuma delas pegou. Por quê?
Porque o estrangeirismo é essencial. Cerca de 70% das palavras do português vêm do latim, e o restante, de outros idiomas. Uma eventual estratégia de defesa do idioma não deveria ser feita por decreto, mas pela melhoria do sistema educacional. Não é razoável que expressões já consolidadas em nossa cultura sejam abrasileiradas. Se assim fosse, como seriam descritos pratos orientais como sushi e yakissoba? E stand-up comedy, performance artística recente, mas cujo termo em inglês não traz dificuldade de compreensão. Como deveria ser, então, anunciado esse tipo de apresentação? "Piada contada de pé"? "Comédia em pé"?
Se os estrangeirismos contribuírem para a eficácia do ato comunicativo, parece não haver qualquer problema. O bom senso acaba prevalecendo. Quando alguém usa muitas palavras estrangeiras numa conversa, soa como algo tolo, pernóstico. É o uso que consagrará tal forma. Nas décadas de 1960 e 1970, os professores de português proibiam o uso do termo "detalhe" por ser estrangeirismo e exigiam o uso de "minúcia". Já pensou o Roberto Carlos cantando "Minúcias" e não "Detalhes"?
Repito, o bom senso deve ser o critério para o uso de palavras estrangeiras. Evite bobagens como: Vou "printar" um documento – "printar" vem do verbo inglês " to print", que quer dizer "imprimir". Assim ninguém precisa "printar" se pode "imprimir", certo?
Do mesmo modo ninguém precisa morar em um flat" se pode morar em um "apartamento".
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Estrangeirismo é essencial |
A esse respeito, o senador e repentista Ronaldo Cunha Lima fez uma deliciosa crítica sobre o emprego exagerado de estrangeirismos:
"A invasão de termos estrangeiros tem sido tão intensa que ninguém estranharia se eu fizesse aqui o seguinte relato do meu cotidiano: Fui ao freezer, abri uma coca diet e um queijo light, e saí cantarolando um jingle, seguido de um gospel, enquanto ligava meu disc player para ouvir uma música new age. Precisava de um relax. Meu check-up indicava stress. Dei um time e fui ler um best-seller no living do meu flat.
Desci ao playground; depois fui fazer o meu cooper. Na rua vi novos outdoors e revi velhos amigos do footing. Um deles comunicou-me a aquisição de uma novamaison, com quatro suites, todos com closet, solarium e home theater, e até convidou-me para o open house. Marcamos, inclusive, um happy hour. Provaríamos uns snacks. Tomaríamos um drink, um scotch, de preferência on the rocks.
O barman, muito chic, parecia um lord inglês. Perguntou-me se eu conhecia o novo point society da city: Times Square, com serviços à la carte e self-service. Voltei para casa, ou, aliás, para o flat, pensando no day after. O que fazer? Dei boa noite ao meu chauffeur que, com muito fair play, respondeu-me: good night." Caberia aí uma sequência: "Good night, my brother. Eu lhe respondi: que intimidade é essa, meu caro partner e stakeholder. Em seguida, ele emendou: desculpe,my boss, my CEO, my chairman, my coach e mio condottiere.
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