Dizer sem palavras. Há diversas formas de dizer: gestos,
olhares, ações, omissões. As palavras são uma pequena dimensão do imenso
universo da comunicação, e muitas vezes, é justamente a dimensão mais leviana.
São como a ponta de um iceberg, existe muito mais ali embutido, sustentando
toda a estrutura da sua mensagem.
Um teatro sem palavras pode parecer ainda mais surreal do
que uma comunicação não verbal. E não se trata de um espetáculo de dança. A
mensagem é transmitida sem palavras, por grunhidos, e não importa o que você
entenda ou perceba, a mensagem é sua. Você irá construí-la a partir da sua
experiência pessoal, e então, se identificará ou não com ela. Entender essa
comunicação e como ela opera no núcleo do indivíduo ou do ambiente social é dos
processos que nos ajudam a controlar melhor o que vamos dizer, como, e no que isso
vai dar. É o sonho de todos nós: não devemos destruir ou construir castelos ou pântanos
com as palavras. Ou com a mensagem que se quer.
O espetáculo “Irmãos de Sangue”, da companha Dos à deux,
não fala. Ele grita uma mensagem de que o conflito entre famílias e pais e
filhos, ou mães e filhos, pode prescindir de qualquer bom português. O
espetáculo, feito de sons, efeitos sonoros e gemidos, é uma contundente
demonstração de que comunicar é um desafio bem mais idiomático do que qualquer
coisa: ele envolve dramas, limitações, sentimentos e sensações inomináveis. Sem
palavras.
O corpo perpetua a nossa ternura indisfarçada de tensão e é
também a extensão da loucura coletiva em que vivemos. Eu adoro as metáforas e
meias palavras cheias de sentido deste texto, assim que a alavanca do espetáculo é o desejo de que
seja tudo traduzido de uma forma menos sofrida para cada um: “diante da dramaticidade da vida, até mesmo
as palavras são descartáveis. Que dimensão perturbadora de um tempo em que a
mente é vassala dos sentidos, mas a alma e corpo estão presos ao romper das
águas de um arpoador, que lhe acerta em cheio no terreno das mais profundas
amarguras e malditas ilusões.”
“Procurar o
desconhecido. Seguir o seu próprio caminho e ir ao âmago do que impele, de
maneira intensa e urgente, a se expressar, a sair de si mesmo. Resistir e
continuar a criar sem descanso. Criar fora das referências e dos modelos e se
arriscar. Mergulhar na poesia e fazer surgir o sentido. Resistir e se dar o
tempo indispensável de explorar. Retomar e recomeçar para se chegar a esse
desconhecido que se revela, pouco a pouco, ao fio dos meandros e improvisos.
Talvez seja isso a utopia da pesquisa.”
“Há mais de quinze
anos que Artur Luanda Ribeiro e André Curti trocam, dialogam, experimentam,
criam juntos, e interpretam espetáculos de teatro gestual. Trata-se realmente
de escritura teatral, mesmo sem nenhum texto ou palavra.”
Uma escritura teatral, com as suas tensões dramáticas,
feitas de conflitos, de suspensões, com os seus elementos obscuros e as
expectativas e a admiração que provocam no espetáculo.
De fato, o mundo mais dramático e verdadeiro prescinde de
palavras!
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