quinta-feira, 19 de fevereiro de 2015

Sonhar não custa - mas concurso sim!


Paula Toller tem uma música tão bonita quanto  ela, que ela canta faceira, embalada num estampado bem brasileiro. “Sonhar não custa nada” é o enredo da música. Mas não é uma ode aos dorminhocos. A gente precisa sonhar de olhos abertos, diz Paula Toller. E nada mais! Todo sonho tem rodas. Mas nem todos têm asas para mover essas rodas e sair da sua zona de conforto. Concurso é isso: saia da sua zona de conforto e encare a turbulência por um tempo indeterminado. Ninguém nos diz: é preciso tentar. Você só encara porque está dentro, lá no fundo, uma vontade mal dormida. Um sonho acordado. Se não é assim, você pede para sair!
Certa feita, uma psicóloga me disse: vá lá, tente, você vai perder nada! Foi um fracasso.  E o custo emocional foi enorme. Mas aquilo não iria alimentar as minhas crianças pelo resto da vida. Um concurso vai. Quando a gente sonha reiteradamente, como quem reza, ou faz uma pregação, talvez o universo conspire para isso e você realmente acredite que aquele é o seu destino. 


Concurso não deve ser obrigação para ninguém. Deve ser um sonho, seu, e de mais ninguém. Deve trazer um tipo de relevância para a sua vida que só os grandes sonhos têm: casar-se, ter filhos, ser um profissional de sucesso. Tudo grande, tudo de longo prazo. Porque o esforço haveria de ser pequeno? Eu tenho uma grande amiga, rígida, estilo inglês, indomável, que diz: não veja a montanha. Tem apenas um passo a ser dado, hoje. Piano piano. Ou como diriam os alemães: lentamente seguro.
Se me perguntarem, eu não saberia o que colocar na balança, como faziam os antigos egípcios com o coração e a pena no ritual da pesagem das almas: ou o sonho, ou a disciplina, como o fator de sucesso do concurso. Suponhamos que o sonho seja o coração e a disciplina seja a pena a ser colocada  na balança, e que, no dia do julgamento, aquele com espírito militar consiga passar pelo crivo dos examinadores como exemplo de glória e persistência. Mas o sonhador receberá seu veredicto com um sorriso nos lábios, fazendo da sua glória, simplesmente, um momento de felicidade. Esse, certamente, conseguiu não apenas uma vaga no serviço público, mas também, um lugar no céu!
Outro grande amigo, oficial de chancelaria do Itamaraty, adora me enviar poemas de Charles Baudelaire, e, talvez ele não saiba, mas eu adoro recebê-los, muito embora eles sejam tão herméticos quanto a vida do poeta francês. Um deles é: “A Voz”. E o que ele fala para mim no finalzinho é incrível:  

“mas a voz consola e diz: "Guarda teus sonhos: Os sábios não os têm tão belos quanto os loucos!"

            Um pouco de loucura também faz parte do sonho. Arrisque. Você tem muito a perder. Mas e daí?! Quando batalhava pela nomeação num dos concursos que passei, despedi-me do poderoso interlocutor com um olhar fixo e a frase mais clichê e verdadeira que já disse: “isto não é um concurso. É um sonho”. Ele me devolveu um dos mais belos sorrisos que já vi. De tão bonita que ela  é, concordo com tudo que Paula Toller diz e canta. Mas ô sonho caro este!  

segunda-feira, 2 de fevereiro de 2015

É o balde ou é o êxodo - exercício sobre a falta de água na redação do seu concurso




É preciso ter faro para identificar um bom texto. E ele não falha. Logo na primeira frase, percebe-se o estilo, a riqueza. É pura consistência. É como amor à primeira vista. Difícil de acontecer. Mas quando acontece,  é isso! A gente sabe que: "é isso"! Você pode se apaixonar por um texto por causa das ideias. Ele te devolve a sua infância. Ele te faz lembrar de biscoitos caseiros quentinhos na casa da vovó. Ou ele mexe com os seus ideias. Te ensina algo. Ou talvez ele seja um flecha na sua emoção: mexe com os seus sentidos, te faz rir ou chorar. Você também pode apaixonar-se por um texto pelas suas palavras. Sua forma curvilínea, uma introdução mais "carnuda", um gênero mais natural, sem muita maquiagem.  
Um texto pode ser um diálogo, uma conversa que vai empolgado aos poucos até virar um "pingue-pongue" eletrizante, como no primeiro encontro. Os dois querem falar ao mesmo tempo e mostrar-se por dentro e por fora. 
Este texto que trago agora é um bom exercício para concurso público - “Vamos precisar de um balde maior”, sobre a crise hídrica em São Paulo.
Eu poderia simplesmente perguntar: por quê? 
Vamos às questões:
quais as técnicas principais que ele usa? 
Que tipo de linguagem é adotado?
Quais as figuras de linguagem utilizadas? 
Como ele constrói os argumentos e que tipo de encadeamento/raciocínio lógico ele vai criando para nos dar a impressão de que estamos numa montanha-russa? Como ele inicia os parágrafos como se apresentasse cada novo ato de um grande espetáculo? 
Quantas, e quais as mais belas metáforas usadas? O que dizer do argumento? Existe um contra-argumento? Existe uma conclusão? Qual é O argumento, ou seja, o que o autor acha de verdade?
Esse texto mostra como ser generalista e em seguida navegar para o particular, para a concretude do específico e assim mergulhar no irrefutável. Ser criativo sem ser lunático. Ser assertivo sem ser pedante. Ser dramático sem apelar. Ser profundo… e coloquial.  Ao invés de "a crise é enorme", poder dizer com elegância: "a palavra 'crise me parece muito pequena diante do que já está desenhado". Os filhos da barbárie, de uma catarse coletiva, dos sem água e sem resposta para o cenário árido que emerge de caixas d'agua vazias. Qual a minha surpresa quando cheguei ao fim do texto, tendo sido tentada desde o início a escrever sobre ele, e encontrei o nome de Eliane Brum, na minha opinião, uma das melhores escritoras do nosso tempo. Eis o meu desafio: dissecar o artigo de Eliane Brum, fazer uma análise profilática. É o seu dever de casa. Divirta-se. Poste no blog ou guarde para você. Não importa! Vale o exercício. Nos próximos posts eu farei os meus comentários sobre este texto. Comparar é aprender!!!!