Paula Toller tem uma música tão bonita
quanto ela, que ela canta faceira,
embalada num estampado bem brasileiro. “Sonhar não custa nada” é o enredo da
música. Mas não é uma ode aos dorminhocos. A gente precisa sonhar de olhos
abertos, diz Paula Toller. E nada mais! Todo sonho tem rodas. Mas nem todos têm
asas para mover essas rodas e sair da sua zona de conforto. Concurso é isso:
saia da sua zona de conforto e encare a turbulência por um tempo indeterminado.
Ninguém nos diz: é preciso tentar. Você só encara porque está dentro, lá no
fundo, uma vontade mal dormida. Um sonho acordado. Se não é assim, você pede
para sair!
Certa feita, uma psicóloga me disse: vá
lá, tente, você vai perder nada! Foi um fracasso. E o custo emocional foi enorme. Mas aquilo
não iria alimentar as minhas crianças pelo resto da vida. Um concurso vai.
Quando a gente sonha reiteradamente, como quem reza, ou faz uma pregação, talvez o universo conspire para isso e você realmente acredite que aquele é o seu
destino.
Concurso não deve ser obrigação para
ninguém. Deve ser um sonho, seu, e de mais ninguém. Deve trazer um tipo de
relevância para a sua vida que só os grandes sonhos têm: casar-se, ter filhos, ser
um profissional de sucesso. Tudo grande, tudo de longo prazo. Porque o esforço
haveria de ser pequeno? Eu tenho uma grande amiga, rígida, estilo inglês,
indomável, que diz: não veja a montanha. Tem apenas um passo a ser dado, hoje. Piano piano. Ou como diriam os alemães:
lentamente seguro.
Se me perguntarem, eu não saberia o que
colocar na balança, como faziam os antigos egípcios com o coração e a pena no
ritual da pesagem das almas: ou o sonho, ou a disciplina, como o fator de
sucesso do concurso. Suponhamos que o sonho seja o coração e a disciplina
seja a pena a ser colocada na balança, e
que, no dia do julgamento, aquele com espírito militar consiga passar pelo
crivo dos examinadores como exemplo de glória e persistência. Mas o sonhador receberá
seu veredicto com um sorriso nos lábios, fazendo da sua glória, simplesmente,
um momento de felicidade. Esse, certamente, conseguiu não apenas uma vaga no serviço público, mas também, um lugar no céu!
Outro grande amigo, oficial de chancelaria
do Itamaraty, adora me enviar poemas de Charles Baudelaire, e, talvez ele não
saiba, mas eu adoro recebê-los, muito embora eles sejam tão herméticos quanto a
vida do poeta francês. Um deles é: “A Voz”. E o que ele fala para mim no
finalzinho é incrível:
“mas a voz consola e diz: "Guarda teus sonhos: Os sábios não os
têm tão belos quanto os loucos!"
Um pouco
de loucura também faz parte do sonho. Arrisque. Você tem muito a perder. Mas e
daí?! Quando batalhava pela nomeação num dos concursos que passei, despedi-me do
poderoso interlocutor com um olhar fixo e a frase mais clichê e verdadeira que
já disse: “isto não é um concurso. É um
sonho”. Ele me devolveu um dos mais belos sorrisos que já vi. De tão bonita
que ela é, concordo com tudo que Paula Toller diz e canta. Mas ô sonho caro este!